26 de agosto de 2018

Jangada

Atravessei o pântano
na jangada que você
me ensinou a construir

Desafiei o mundo
sem nunca deixar
a dor me consumir

O seu amor foi tanto
que por toda a vida
me ensinou como seguir
sem você

Ensinou que o pranto
e as despedidas
são essenciais pra se viver
Fortalecer

E hoje, quando eu canto
minhas feridas se curam
em cada canto do meu ser

Você deixou mais que memórias
Mais que histórias
Mais do que eu possa escrever

Você deixou seus sonhos
Suas verdades
Sua sede de viver e aprender

Você marcou minha alma
Carimbou e assinou
Me fez vencer, me fez assim

Você se deixou em mim


(Para minha tia Ligia)

14 de agosto de 2018

Se cala

Sobe
E de lá de cima vê
A vida
Que não mostra a TV
Sofrida
De quem só olha pro chão
Porque não aprendeu a se erguer
Que ninguém acreditou que ia vencer

Olha pro morro
Pro preto
Pro medo
Pro grito
Pro choro
E se cala

Olha o menino
Descalço
Com medo
Correndo
Fugindo
Da bala

Olha a menina
Sofrendo
Vendendo
Por troco
Seu corpo
E me fala

Olhando no meu olho, me fala
Me fala que não vê a senzala

Se faz de morto que não enxerga a morte
Cego por opção
Egoísta de berço, de passo fácil
De luta pequena, que não estende a mão

É direito seu calar essa boca
É mais do que dever se abster
Se tua pele não assina seu óbito no dia de nascer

Estela Seccatto
14 de agosto de 2018